DEPOIMENTO
DE PILAR JUAN MARTINEZ
PcP (44 anos)
Valência – Espanha (*)
Olho para trás tentando lembrar como era tudo antes do Parkinson tornar-se parte de meus dias e vejo apagar-se essa lembrança em minha memória. Correu muita água desde então, pois tinha 15 anos apenas.
Recordo que subitamente minha força tornou-se cansaço, meu caminhar fez-se desengonçado, inseguro e meu pulso não cessava de tremer ligeiramente. Ninguém deu importância, depois que vários médicos me disseram que eram os nervos. Simplesmente fui ao neurologista e me colocaram em tratamento e assim passei anos.
Lembro-me que aos 20 me internaram em um hospital para fazer exames de todo tipo. Ali tive minha primeira boa lição de vida. Aprendi a dar valor às pessoas por seu interior, a sobreviver diante da adversidade, a superar os medos à força de coragem, a enfrentar sozinha uma realidade adversa. O diagnóstico foi que padecia de uma doença de tipo neurológico de origem desconhecida e de evolução ainda mais incerta.
Minha vida seguiu seu caminho. Casei-me aos 28 anos e tive minha única filha. Recordo-me que aconteceu de repente, por ocasião da festa de Reis. Meu pulso começou a tremer exageradamente ao empurrar o carrinho de bebê, então com cinco meses de nascida, e me foi impossível chegar ao destino.
Nesse dia algo em mim escureceu. No meu íntimo algo dizia que aquilo era somente o começo e assim foi. Muitos fatos novos e mudanças radicais aconteceram em minha vida. A partir daquele momento nada voltou a ser como antes. A cada visita ao neurologista meu estado de espírito decaia e minhas ilusões se esfumavam. Nem era preciso que alguém me dissesse, pois dia a dia percebia a impossibilidade de cuidar de minha filha sentindo essa fraqueza tão intensa que me tirava a vontade e o prazer, indicadora da anormalidade da rigidez, daquela extrema apatia.
E assim, pouco a pouco, de instante a instante se evaporavam as esperanças. Ajuda espiritual tive pouca, muito pouca, pelos menos de quem mais devia esperar. Pode-se dizer que saí sozinha desse caos em que me vi mergulhada. Por minha filha, por meus pais, por eles lutei com todas as minhas forças. A eles se juntou Fernando, meu companheiro e amigo, quem me apóia e melhor me compreende. A ele devo estas novas ilusões e esperanças, a ele devo o brilho de meus olhos.
A coisa mais importante que aprendi na vida foi a sabedoria de aproveitar cada segundo de meus dias. Valorizar realmente o que vale a pena, quem merece minha amizade e entender que cada minuto é sagrado para mim. Trato de desfrutar com quem verdadeiramente quero os momentos que a sorte me proporciona, fazendo coisas simples, para mim autênticos milagres, como passear, algo que me dá prazer, me encanta e do qual desfruto devorando cada paisagem, cada passo da marcha, cada risada compartilhada.
Aprendi com as pessoas que lutam pela minha causa – algumas me acompanham, são minhas amigas e com elas caminho de mãos dadas, ajudando-as a levantar-se a cada tropeço, numa ajuda mútua compensadora dos maus pedaços – que é humano cair e obrigatório erguer-se. Elas me contagiaram com sua força e vontade de descobrir uma solução para tornar nossas vidas mais agradáveis.
Luto para que sejamos compreendidos e apoiados pela sociedade, luto pela inclusão social plena, luto para conseguir livrar os que vierem depois de mim deste sofrimento, luto por minha família, por meus amigos e por todos aqueles que necessitam um empurrão para continuar a corrida de obstáculos e cada um que salvo me enche de orgulho.
Procuro preocupar-me pouco com o que resta por viver. Vivo cada dia o mais intensamente que posso e desfruto cada momento como se fora mágico, porque para mim realmente eles assim o são. Daquela que fui pouco restou. Aprendi a conhecer-me melhor nesta nova etapa da vida, a querer-me, a amar mais os outros e posso dizer que sou feliz apesar de tudo.
(*) Tradução: Marcilio Dias dos Santos
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