10 dezembro 2009

Para a ABP
aos cuidados do Sr. Samuel Grossmann
Introdução

O Sr. Heinz Jaschke mora na Alemanha e ficou sabendo há pouco tempo da existência da ABP através de seu vizinho Raul Guerreiro (um professor e tradutor técnico paulistano, hoje residente na Alemanha). Por ocasião do aniversário da ABP, o Sr. Jaschke manda suas saudações fraternais e aproveita para oferecer o texto (em alemão e português) de um artigo que foi recentemente publicado no jornal de sua região, no qual ele foi entrevistado como paciente parkinsoniano.

Ele envia também as seguintes palavras pessoais dedicadas à ABP: «Já conheci o Brasil, de passagem pelo Rio de Janeiro em 1979, a caminho de Buenos Aires para organizar alguns projetos industriais para a firma alemã Heller (no Brasil: Heller Máquinas Operatrizes em Sorocaba), da qual sou um dos mais antigos colaboradores aposentados. É pena que São Paulo está um pouco longe, senão eu dava um passeio até aí hoje dia 10/12/2009 para estar um pouco com vocês. Meios de locomoção não me faltam...».

Hoje, dia 10/12/2009 haverá aqui na Alemanha uma reunião da associação dos parkinsonianos e o Sr. Jaschke vai propor um projeto: uma visita dos "amigos de destino da Alemanha" aos "amigos de destino do Brasil" no ano que vem.

Por outro lado, o jornal local gostaria de publicar uma notícia sobre a comemoração dos 24 (25?) anos da ABP e algum eco encontrado para esta curta mensagem, surgida praticamente no "last minute" da parte da Alemanha!

(Artigo em português)

Como Heinz Jaschke tomou seu destino nas próprias mãos Todos os dias, de manhã cedo e ao meio-dia, podemos ver Heinz Jaschke passeando pelas ruas da sua cidade na Alemanha, apoiado nas suas bengalas. Mas não se trata de qualquer luta para perder peso. Com seus 81 anos, ele enfrenta uma doença muito peculiar: Morbus Parkinson.

Autor: Uwe Gottwald, redator do jornal Nuertinger Zeitung, Alemanha
Tradução: Raul Guerreiro (guerreiro@t-online.de)

A doença apareceu aos poucos e foi se agravando ao longo dos anos. Tipicamente, ela é provocada pela morte de certas células no cérebro, que produzem certas substâncias responsáveis pela coordenação dos movimentos. Os pacientes parkinsonianos podem sofrer de estremecimentos ou endurecimentos musculares, com a consequente limitação dos seus movimentos e uma falta de motivação para quaisquer outras atividades. Também não é raro o aparecimento de dores nos músculos e na região das articulações, como no caso do reumatismo. Calcula-se que existem hoje na Alemanha cerca de 300.000 a 400.000 pacientes parkinsonianos. Os casos mais recentes surgem na faixa etária dos 50-60 anos.

Não existe até hoje uma solução definitiva para esta doença, mas apenas uma forma de aliviar a progressão da mesma. Entre outras coisas, temos o tratamento através de medicamentos. Mas importantíssimo é também a prática de movimentos. O provérbio alemão "Wer rastet, der rostet" ("Quem repousa, enferruja") assume um significado real e absoluto para os pacientes parkinsonianos.

Heinz Jaschke ficou sabendo da sua condição quando tinha 60 anos, e isso foi um tremendo choque. Como negociante industrial, ele ainda estava completamente mergulhado na sua profissão, a serviço da empresa Heller. Como responsável pela organização de inúmeros projetos de montagens industriais no exterior, ele estava acostumado com intensas atividades e a responsabilidade de tomar decisões. Sua crescente paralização dos movimentos do corpo constituía uma charada, mas um diagnóstico médico forneceu finalmente a resposta.

A partir de então, tornou-se impossível continuar a trabalhar normalmente. Mas ele não se jogou em qualquer sofá de sua casa – ele assumiu a responsabilidade para si e para os outros membros na família. Naquela época, já havia encontros de auto-ajuda na sua cidade, e assim Heinz Jaschke juntou-se aos mesmos. Pouco depois foi fundado o Grupo Regional de Auto-Ajuda de Nuertingen/Kirchheim, sob os auspícios da Associação Parkinson da Alemanha. Atualmente, o grupo está integrado na rede dos grupos de auto-ajuda, com contato através do Ponto do Cidadão do município de Nürtingen.

Com base em sua experiência, Heinz Jaschke pode confirmar um aspecto fundamental: "Quando estamos integrados em um grupo, é mais fácil lidar com os problemas. Conseguimos ganhar uma motivação de parte a parte, a fim de enfrentarmos a doença e não nos entregarmos à situação". Os conselhos e as informações trocadas mutuamente nessas ocasiões são importantes, inclusive para conhecer alternativas de terapias, ofertas de caixas de assistência, e outras dicas. Conforme ele lembrou: "Isso também ajuda a manter firme nossa dignidade como pacientes".

O que sempre o ajudou foram os movimentos regulares, mesmo com 81 anos. Por isso, ele participa em grupos de ginástica, organizados pelo seu grupo de auto-ajuda em colaboração com uma associação esportiva. No começo, as caixas de assistência cobriam as despesas. "Mas o último curso fui eu mesmo que tive de pagar, porque disseram que eu já conhecia os exercícios e a partir daí também podia fazê-los em casa!". Ele respeitou a decisão, mas achou que foi uma medida negativa: "Quando estamos em grupo, ficamos bem mais motivados para realizar certas ginásticas que pedem mais esforço". Alguns pacientes parkinsonianos também praticam o esporte de tiro-ao-alvo. Junto com outras pessoas já experimentadas, eles podem aprender a coordenar melhor seus movimentos.

Exercícios diários aliviam os sintomas
É claro que essa recomendação não vale para toda a gente, pois os sintomas podem realmente ser bastante variados. Algumas pessoas sofrem sobretudo de agitações nos membros, enquanto que outras sentem um endurecimento geral do sistema muscular. A maneira insegura de andar é outra coisa típica, pois os reflexos de compensação do equilíbrio ficam enfraquecidos devido a problemas neurológicos.

Para Heinz Jaschke, o movimento é uma grande ajuda. Ele quase nunca desiste de seus passeios, mesmo que em certos dias ele sinta mais estremecimentos do que nunca. "De manhã é a melhor hora; aí eu consigo ir bem longe". Mas na parte da tarde ele sente mais fortemente o endurecimento dos membros. Assim, no meio de um bate-papo com alguém, ele às vezes tem que se levantar, sacudir os braços e as pernas, e dar umas voltas pela sala. Mas isso não o preocupa. "É possível convivermos com a doença. E se as outras pessoas tiverem paciência conosco, isso ajuda ainda muito mais". Ele lembrou também outro aspecto importante: "Mentalmente estamos bem claros e conscientes, mesmo que certas pessoas tenham dificuldade em falar ou andar". Para o público em geral, ele tem uma recomendação: "Antes que as pessoas pensem que estão perante um bêbado que sofreu um tropeção e se estatelou no chão, elas deviam pensar um pouco que existe uma doença chamada Parkinson...". Mas ele conhece também outro aspecto: "A demência pode aparecer, mas não é obrigatória". Por isso, durante os encontros do seu grupo na parte da tarde, são feitos também exercícios de pensamento e memória. Heinz Jaschke mantém-se intelectualmente em forma através de exercícios com palavras cruzadas, assistindo também regularmente ao noticiário televisivo, ou lendo o "Nürtinger Zeitung", que é seu jornal local.

Heinz Jaschke lembrou que os pacientes parkinsonianos conseguem fazer muito mais do que as pessoas em geral pensam, inclusive os especialistas. Ele lembrou o caso de sua primeira temporada em que esteve internado numa clínica especializada, na Floresta Negra, onde ele tem que ir regularmente durante três a quatro semanas cada ano. Nessa clínica ele recebe massagens e faz exercícios de ginástica, sendo ainda feita uma importante adaptação exata da sua medicamentação. "No refeitório, antigamente eles só distribuíam talheres de plástico, com medo que os pacientes se ferissem inadvertidamente. Aí eu fiz logo uma reclamação e solicitei para que fossem colocados nas mesas garfos normais, e facas que realmente cortassem...".

Nos últimos tempos, a doença de Parkinson vem sendo estudada em profundidade. Com uma medicação acompanhada por exercícios físicos, e eventualmente também exercícios de logopedia a fim de apoiar a capacidade de vocalização, os sintomas podem ser atenuados e o agravamento da condição geral pode ser bem retardado. Na clínica, Heinz Jaschke teve a oportunidade de verificar vários exemplos de melhorias que podem servir para encorajar muitas pessoas: "Algumas pessoas tinham chegado em cadeiras de rodas, mas no fim partiram andando com suas próprias pernas".

Heinz Jaschke nunca se entregou à sua situação. Durante seus passeios pelo bairro, ele não só se mantém em forma corporalmente, mas também cultiva contatos humanos, sem ficar se lamentando sobre o estado da sua saúde. Mesmo que ele tenha sido obrigado a desistir de sua licença de motorista devido aos sintomas perturbadores que apareciam de repente, ele está bem preparado para dar voltas ainda maiores. "Por exemplo, ainda consigo pegar um ônibus para ir até ao centro da cidade. O importante é uma pessoa procurar contatos, e nunca se entregar ou se encafifar", sublinhou ele.

Manter o maior grau de autonomia é uma primazia, mas ele também conhece outro aspecto: "Quando não temos outra alternativa, temos que saber nos entregarmos". Para isso, sua esposa Luise é como um presente caído do céu. "Posso contar sempre com ela!". E seus filhos adultos também lhe dão sempre uma mão em trabalhos de casa ou jardim. Heinz Jaschke não lamenta seu destino: "Afinal, há pessoas que passam muito pior do que eu".

Com seus 81 anos, sua fé é algo que também o ajuda. Antigamente, ele foi durante 25 anos diretor de uma escolinha bíblica para crianças no bairro de Enzenhardt, tendo feito parte do conselho paroquial. Assim, Heinz Jaschke não briga com Deus, sabendo que deve ele próprio prestar sua contribuição. "Afinal, não nos foi prometido o paraíso na terra", comentou ele com um ligeiro sorriso.

(O Sr. Heinz Jaschke pode ser contatado em idioma alemão através do email: guerreiro@t-online.de)